Senti agora a sensação daquela grama molhada pinicando as pernas enquanto andávamos, de mãos dadas, em direção à parada de ônibus, todas as manhãs, a caminho da escola. Isso ainda era no começo da década de 90.
A sensação veio em resposta a uma pergunta que me fiz assim que acordei, neste dia 8 de março: “quem é a minha referência de mulher?” Hoje, com mais noção do mundo e de como são as relações, preciso falar da sua história para entender a minha.
Ela era a caçula da família. Viveu pouco o machismo dentro de casa, pois perdeu o pai muito jovem. Mas, seu Zé, um baixinho maranhense de fala mansa, era um homem sábio. Dizia que o primeiro amor de uma mulher deveria ser o diploma.
Ela era uma das poucas entre as mulheres do seu convívio que não seguiam o ritmo “bela, recatada e do lar”. Começou a entender que fugia um pouco dos padrões. Bebia, fumava, gostava de roupas que ninguém usava. Caia no samba aos finais de semana, namorou um americano, cantava Renato Russo embaixo dos blocos da asa sul e aproveitou tudo que a década de 70/80 lhe ofereceu.
Seu ciclo de amigos era diversificado. Incluía negros, gays e drogados - o que irritava seu Zé que, apesar de pouco machista, carregava herança racista e preconceituosa.
Com 20 e poucos anos, a menina subiu ao altar almejando um romance de cinema. O noivo? Um garanhão da época. Pagou a cerimônia dos sonhos praticamente sozinha. Ainda entendia pouco sobre o amor. Também era pouco calejada da vida. No auge da inocência e empolgação juvenil, viveu um relacionamento problemático por uma década.
Após refletir sobre o seu papel enquanto esposa, decidiu que não precisava viver naquele contexto conturbado. Entendeu que o pão que o diabo amassou não era mesmo para mulheres como ela. Além de gerar uma filha, o primeiro casamento foi responsável por ensiná-la a lutar por independência e liberdade. O amadurecimento foi mostrando o verdadeiro papel de uma mulher.
Com 30 e poucos anos, tinha um divórcio, sonhos frustrados, alguns traumas e uma menininha de 7 anos que pouco entendia daquele cenário. Com ajuda do espiritismo e de outra grande mulher - sua mãe - procurou dar o essencial para que o fruto do antigo relacionamento não lhe trouxesse os mesmos problemas já vividos.
Casou-se de novo, depois de se transformar no que já idealizava: uma mulher forte, independente e segura de si. A idade e as experiências lhe trouxeram sabedoria. A sabedoria lhe proporcionou o gosto doce e confortante de um amor tranquilo “com sabor de fruta mordida”, como diria Cazuza.
Hoje vive em paz, em uma vida totalmente oposta à de 20 e poucos anos atrás. Conheceu a Europa, vai se graduar em breve, pela segunda vez, e nunca abandonou a ideia de “não seguir padrões”.
Exigiu de si mesma o título de melhor mãe do mundo, como a maioria das mães fazem. Sofreu julgamentos alheios por não ter dado a educação “ideal”. E isso lá existe?
A jornalista que ela carregou 9 meses na barriga não é das mais princesas e delicadas, como ela também idealizou. Na verdade, é um pouco rebelde. Mas que jornalista não é?
Acontece que não tinha como ser uma mocinha frágil com uma mãe tão poderosa. Às vezes me questiono de onde vem tanta sede de liberdade, independência e empoderamento. Agora vejo que o meu “Girl Power” não é em vão e não é de hoje.
Parece que o "Mariana, come direito. Mariana, senta direito. Mariana, fala direito", não funcionou muito. Mas aí já não é culpa sua..
Seu maior mérito foi me ensinar a ser uma mulher com o seu poder.
Te amo.
Que linda homenagem!! Sua mãe criou uma mulher para a vida real e não para contos de fada! Parabéns para as duas!
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