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Quem eu sou

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Meu pai morreu sem ser compreendido



Não existe mesmo um acalanto ou uma palavra de conforto para quando se perde alguém que não só se amava muito, como também se identificava muito. Esse era o meu pai pra mim. A nossa alma era gêmea, a gente se lia, se via, muito além do que os olhos enxergam. Conexão real, profunda, de ficar à vontade para ser quem se é, do jeito que se é e sentir aconchego nisso. Sentir abraço no olhar e carinho nas palavras. 

Confesso que somos sim meio fora do padrão. Que somos calorosos e solitários ao mesmo tempo e que nossa forma de amar é diferente..

Hoje, caminhando com os meus próprios pés e vivendo as minhas experiências como adulta completa, sinto meu pai ainda mais perto de mim. Isso porque hoje eu me liberto pra ser eu, na minha grandeza, nos meus exageros, na minha fuga natural de padrões, sem aceitar mais o julgamento dos princípios de educação regrada da infância. Sem aceitar mais nada que me limite a ser quem eu sou. 

Quando a gente foge da nossa essência, por vontade própria, ou por vontade do outro, nasce sim o sentimento de solidão, a angústia, o aperto..o sentimento de abandono é por ser abandonado por si mesmo. É a busca e a vontade de ser compreendido na essência. São as consequências imediatas de se permitir mudar pequenas coisas do próprio universo ou das próprias construções, as vezes tão pequenas, mas tão essenciais. 

A verdade é que eu cresci entendendo ser diferente e tentando me adequar ao que não era meu, nem era eu. 

Quando penso em aconchego me vem pessoas que me compreendem na minha imensidão. Não necessariamente que me compreendem e que também se identificam, como meu pai era pra mim, mas que me compreendem. Aqueles que aceitam mergulhar em mim, de corpo e alma. Que me validam. Que acreditam. Que aceitam. Que ficam. 

Quando penso em aconchego, me vem meu companheiro, alguns pouquíssimos que me rodeiam e, claro, meu pai, como o primeiro acolhimento da minha vida. 

Pai, eu sou muito você e como queria você por perto pra gente poder continuar compartilhando o complexo infinito que é ser a gente, e pra liberar as angústias que sinto por às vezes não ser eu e também por não ter mais você.

Obrigada por deixar TANTO de você em mim. 

Obrigada pelos nossos 27 anos juntos, de corpo e de alma. 

sábado, 3 de abril de 2021

A realidade de ser quem se é


A cada nova dor de não saber ser o mínimo, abre-se uma nova cortina, expondo a claridade de ser quem se é.

A maturidade dos quase 30 trazem a realidade sobre si. O volume de amizades se torna cada vez mais restrito, também pelos distanciamentos que a própria vida se encarrega de direcionar. Mas, muitos dos que vieram e foram embora do convívio, ao longo dessa jovem vida, tem a ver com a imperfeição que se carrega em simplesmente não ser agradável para o outro. 

Os "adeus" de pessoas que em determinado momento foram importantes, estampam para si a imperfeição de ser falho. Movimento que, ao longo do tempo, convoca a humildade a tomar conta da cena.

E até quando os que, agora estão, conseguirão estar? E como acertar com os que ficam? E como tolerar os próprios erros? (que sim, são humanos)

As lembranças são de aglomerações de pessoas queridas, sorrisos, disposição em acertar e amor gritado aos quatro ventos que, com o tempo, mudam de ares. O que se tem é cada vez mais de si mesmo, de consciência, de reflexões, menos pessoas, menos sorrisos, e mais sobre consciência e percepção do que foi feito para que cada um decidisse pegar seus pertences e sair exausto pela porta que você mesmo abriu.

É preciso voltar um pouco nos primeiros anos da vida para analisar o começo de tudo. Por isso, é preciso reconhecer que mães são incríveis. Desde a juventude, enxergam no filho um gênio, alguém diferenciado, inteligente demais comparado aos outros. Esperto demais comparado aos outros. Doce e educado demais, se comparado aos outros da mesma idade...Mas, quantos estímulos ilusórios isso traz sobre a realidade de não ser nada disso?! O olhar doce das mães é sublime, mas a percepção ao longo da vida é de que são olhares que só esse amor tão sublime consegue oferecer. Só essa figura consegue enxergar defeitos, ignorá-los, e amar de muito perto, ou de muito longe.  

No fim das contas, convivendo com imperfeições, vai estar quem conseguir lidar. Podem ser 30 pessoas, podem ser 3, podem ser 2, ou nenhuma. Pode ser também só um cachorro, estes certamente vieram ao mundo para consolar corações que se enxergam imperfeitos demais para a convivência humana. Plantas também, apesar de mais discretas na interação. Algumas mais lindas, delicadas e frágeis, como girassóis. Outras com uma beleza menos colorida e mais seca, como cactos. Firmes, duros, imponentes, confiantes. Me agrada muito ter por perto no momento.  

Por enquanto, ainda fragilizada, mas esperando a autoconfiança e maturidade dos próximos meses e anos me trazerem mais sobre ser quem se é, agir sem magoar e superar quando decidem não estar.

Costumo encerrar textos com uma reflexão positiva e mensagens que tragam soluções para minhas próprias dores. Mas, este aqui é um texto sobre dores, que não são dores clichês de amor, de saudade..  são dores do autoconhecimento, do amadurecimento e da realidade. Dores sobre si. Nada mais. 


sexta-feira, 10 de abril de 2020

Aceitar que não me aceitem e o amor como cura


Com o coração na mão



Estava cá pensando com meus botões - que inclusive estão trabalhando a todo vapor nessa quarentena, já que, quase sempre, sobra tempo livre. Me questionei: por que essa necessidade de querer ser aceita por quem não consigo agradar de nenhuma forma? Por que dói tanto não ser bem recebida em algum ambiente? Para que dar tanta importância a quem, nitidamente, não te suporta?

Voltando um pouco no tempo e buscando entender a infância para entender o presente, eu tenho lembranças de sempre ter sido uma criança adorável. Ria e falava com quem me desse corda, e até com quem não me desse. Cresci ouvindo que eu era sorridente demais, simpática demais, educada demais, linda demais e sabia me comportar em qualquer ambiente. A tudo isso, soma-se o fato de que eu era – e sempre fui- a única filha dos meus pais.

Na escola, eu me sentia sim, “o último biscoito do pacote”. Era exemplar, apesar de faladeira. Era a que todos imitavam. A preferida de muitos, a “melhor amiga” de muitas e a escolhida de tantos outros. Mesmo não sendo sempre a mais bonita, era sempre a que estava rodeada de atenção e carinho.

Não fazia ideia, naquela altura, das consequências psicológicas e emocionais que tantos estímulos positivos poderiam me trazer e fazer crer ser perfeita demais para errar ou para desagradar alguém.

O pequeno reinado da criança perfeita não durou por muito tempo. A escola é sempre uma prévia do que se vai encontrar na vida real. Dos 15 em diante, fui entendendo que eu não vivia em um conto de fadas e muito menos era a princesa protagonista. Era só mais uma “ser humaninha” com vários defeitos que desagradariam SIM. Fui descobrindo a habilidade de conseguir desagradar alguém até mesmo calada. Eu não seria aceita em qualquer ambiente e nem todos gostariam de mim, mesmo que eu tentasse muito.

Sofri alguns bullyings que me ajudaram no senso de realidade. Eu não era bonita como eu pensava que fosse, nem tão adorável assim, como eu ouvia até então. Além disso, até me render ao alisamento capilar, eu era a única da sala que tinha cabelos cacheados - motivo também para chacotas e exclusões.

Foi nesse contexto que nasceu a minha tendência ao perfeccionismo, à necessidade de ser amada e de voltar a ter os estímulos da infância. Começou a nascer a tendência de almejar que me devolvessem carinhos e sorrisos à altura do que eu entregava. Que egoísta, né? Como querer que me retribuam da maneira que EU acho adequada? Ou melhor: como querer que, minimamente, me retribuam e me aceitem? Será que sou realmente tão perfeita e especial assim que não posso ser detestada por alguém?  

Gabriel, meu namorado e amigo, com quem aprendo tanto lições como ser mais desapegada e seletiva com o que de fato é preciso dar importância, me fez uma pergunta chave depois de eu ter desabafado algumas mágoas: 

- Por que você faz tanto para agradar? 
Respondi que é porque eu queria muito que gostassem de mim..
E ele perguntou o porquê dessa vontade. 
Fiquei completamente sem respostas e com ainda mais questionamentos:
- Por que a necessidade de fazer com que gostem de mim quando já está claro que isso não será possível?

Desde essa conversa com ele, passei a questionar tantos “esforços” aos quais me submeto para receber uma simples “aceitação”, principalmente quando tenho certeza de que não sou aceita. É bem desgastante, já que é um esforço sem retornos agradáveis. Pelo contrário, parece que quanto mais se esforça, menos se alcança o objetivo.

Óbvio que não é fácil o movimento de simplesmente “deixar para lá”. Seria o “crème de la crème” se eu tivesse essa facilidade. Mas não. São passos que se dão, a partir das situações que nos são colocadas.

É uma luta constante da linda Mariana sorridente e amigável de 8 anos de idade que agradava a todos, contra a Mariana de 28 anos, coberta de defeitos e que não necessariamente vai ser amada por todos. É um movimento completamente meu. Eu me dou por inteiro, me esforço ao máximo e quando recebo o “não” indireto do outro, vem a frustração. E ela vem embaladinha na raiva e no choro, por me sentir tão incapaz do que considero o mínimo: a aceitação.

Hoje, tento encarar com mais amor aqueles pelos quais dei tudo de mim para que me aceitassem. Isso pelo bem da minha saúde mental. Tento transformar a mágoa em gratidão, afinal, pensando racionalmente, estão acrescentando muito na minha evolução como pessoa e nos meus aprendizados de vida. Me ensinam também a ser humilde. Me fazem aprender exatamente o que eu preciso aprender. Me fazem resgatar a infância para entender o presente e quebrar os padrões que devem ser quebrados.

É um clichêzão, mas eu preciso dizer que o amor é aquele sentimento chave para curar qualquer mancha no coração. Já me sinto especial por recorrer a ele para conseguir cicatrizar feridas que acabei permitindo que deixassem em mim (o nome disso é rancor).

Escrevendo assim parece simples, mas é um pequeno exercício diário, que ainda sigo tentando. E como já falei em outros textos, escrever me ajuda a desembaçar as vistas e a organizar melhor a cabeça e o coração.

Espero que o amor seja sempre aquele itenzinho da nossa caxinha de remédios, sabe? Aquele que a gente procura, em meio aquela bagunça, sabendo que vai curar.

Só olhando O OUTRO com AMOR, é que se obtém a NOSSA PRÓPRIA cura. É lindo, né? Mas podia ser tão fácil quanto é inspirador.

“O Cristo não pediu muita coisa, não exigiu que as pessoas escalassem o Everest ou fizessem grandes sacrifícios. Ele só pediu que nos amássemos uns aos outros” (Chico Xavier)

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Gabriel é um artista


Por alto, eu já sabia disso, mas, os dias em São Paulo com ele foram a comprovação da minha tese. O curioso é que Gabriel não conhecia a cidade que, de cara, lhe foi extremamente familiar. A cada muro, prédio, parede grafitada das ruas paulistanas - clássicos da cidade - Gabriel não só apontava quem era o artista responsável, mas contava a história da obra.

As exposições então foram um prato cheio para estimular ainda mais tanta sensibilidade.

Gabriel passeou por Tarsila do Amaral, Van Gogh, Dalí e tantos outros, com atenção, e criticou alguns outros nomes que se expressavam de formas mais abstratas. Claro que, para mim, apreciadora, porém, pouco conhecedora de artes visuais, os nomes me remetiam apenas às salas de aula do ensino médio. Gabriel não. Gabriel realmente conhecia. Observava com atenção as linhas e expressões de cada quadro, de cada escultura.


Gabriel é um artista e um apreciador de arte, mas pasmem, ele não é um chatão. Também passava rápido pelos temas que pouco lhe interessavam, não parava horas lendo a história de cada peça, criticava as que não faziam nenhum sentido, questionava como algumas obras eram consideradas obras, ria dos memes bobos que eu fazia com as expressões engraçadas das esculturas e apontava o extintor de incêndio do museu como a obra de arte mais bonita do local.

Passeamos por exposições infantis como Batman e Turma da Mônica - minha preferida, por sinal- e curtimos a exposição interativa feminista.



E como bom arquiteto que é, Gabriel também apreciou as fachadas diferentonas dos prédios da Paulista, olhava para o teto e para o chão de qualquer lugar que entrava, criticou escadas de madeira da pinacoteca - que já não me lembro por que não eram boas - e falou sobre tantas outras expressões arquitetônicas que aí é que eu não entendo nada mesmo.



Gabriel é um artista! E não só isso. Gabriel é uma obra de arte rara. É um puta de um um gato! Além de apreciador de música, de arte, de plantas, de cores e das belezas simples da vida. Todo bem feito e todo perfeito, no que tem que ser. Mas com alguns defeitos sim, como tem que ter.



Foi a melhor obra de arte que vi em São Paulo, que vejo quase todos os dias e que pretendo dividir os sabores mais doces e mais amargos desta caminhada.

Gabriel é um artista. É minha obra de arte preferida.

  

terça-feira, 11 de junho de 2019

1 ano sem esse cara muito singular







Meu pai era um cara muito singular. Mas é sério, ele era um cara muito singular. Tinha um jeito debochado, uma risada contagiante e além de ser um cara que exalava carisma, era um gato! Arrebatava corações! Falava cantando, com um chiado carioca charmoso. Ria de tudo, assim como eu. Jogava os cabelos lisos e grisalhos enquanto dirigia e mascava chiclete piscando os olhos. Tinha umas manias só dele. Mordia os lábios e a boca com frequência - o tal bruxismo que eu herdei com força. Sério, ele era um cara muito singular. Ele era tão cheiroso! Tinha cheirinho de pai. E os olhos? Castanhos quase verdes e grandões! Ele era tão singular..

Cara, meu pai amava estrada. Deitava o cabelo pelas pistas desse Brasil. Gostava da liberdade, do vento na cara, do mar...Sério, ele era um cara muito singular! 

A gente amava coisas simples! Passeios simples, conversas simples, roupas simples...comidas simples! Tudo que fosse simples, com ele, era muito empolgante! Meu pai comia tudo que via pela frente e comia muito! Biscoito recheado barato ensopado num copo de leite era uma delas. A gente também amava mortadela no pão, com muita manteiga. “HUMMM BOM NÉ”?, ele falava rindo com o olhão arregalado e as bochechas estufadas imitando os gordinhos. Era viciado em doces – pudim (“PUNDINHO”, como ele chamava) e “balinhas de ponto de ônibus”, aquelas 7 belos de 5 centavos que vendiam nas paradas da W3.

Falando em vício, meu pai lutou contra vários. Foi um dependente químico - pude até escutar ele falando isso nas reuniões de A.A/N.A. Eu adorava acompanhar, achava ele um heróizão por ter vencido bravamente a bebida e as drogas. Sério, meu pai era um cara muito singular! 

Que sorte ter sido o seu grande amor! Há um ano atrás, você se despedia de mim, dizendo que eu fui a coisa mais importante e linda que você fez na vida. Você já sabia, mas eu fugia do fato de que aquela era sim uma despedida. 

A saudade por aqui é persistente: não tem um dia que eu não fale ou lembre de você. Para o meu namorado, eu falo você tinha que ter conhecido meu pai, ele era um cara singular”, “Se meu pai te conhecesse, te daria um apelido”, e fico imaginando qual apelido ele daria...

Sério, amigos, meu pai era um cara muito singular. Conto pro meu namorado algumas intimidades engraçadas do meu pai e ele fala rindo “é, seu pai era muito doido mesmo”. Que saudade do pouco tempo que tivemos juntos. 

Não acho que 26 anos foi muito tempo, mas foi o suficiente pra eu ser tão grata por todo amor que me deu e por toda aventura e diversão que era ser sua filha. Sério pai, você foi um cara muito singular. Queria tanto poder compartilhar com você tantas coisas que vivi neste último ano. Sei que você me vê daí, sei que me acompanha e isso até que me conforta sim.

Sério, meu pai era um cara muito singular.

Pai, sério, você era um cara muito singular.

Receba meu abraço muito apertado e receba o maior amor que eu puder transmitir. Te amo pro resto da vida e muito, muito além desta vida.

Meu eterno amor <3